Entrevista a Cristina Norton

Esta semana a nossa convidada para a entrevista foi a escritora Cristina Norton, a quem agradeço desde já o ter aceite participar na rubrica "Entrevistas".
Cristina Norton nasceu na Argentina mas vive em Portugal há mais de 30 anos. Conta com uma vasta obra publicada, onde destacamos os romances: "O Afinador de Pianos", "O Segredo da Bastarda" e "O Guardião de Livros".

HT: A Cristina tem uma vasta obra publicada, que vai desde a poesia aos romances, passando também pela literatura infantil. Qual o género que lhe dá mais prazer escrever?
Cristina Norton:
Escrever é sempre um prazer, independentemente do género. A escolha é difícil, mas posso confessar que só escrevi poesia na minha adolescência e juventude, depois deixou de acontecer, com grande pena minha. O conto, seja o infanto-juvenil ou para adultos, é uma paixão. A leitura de um bom conto deixa-me maravilhada, pela densidade, a força e o que o autor consegue despertar em nós em poucas páginas. Também poderia dizer que é o que mais gosto de escrever, ainda que me sinta amordaçada por viver num país onde o conto é tido como um estilo menor e pouco vendável. Por isso, dedico-me ao romance que escrevo com o mesmo entusiasmo e até me dá a possibilidade de viver durante mais tempo dentro de cada personagem.

HT: O facto de ser casada com alguém que se dedica à investigação e escrita teve alguma influência na escolha dos temas para os seus livros?
Cristina Norton:
Comecei a publicar aos 17 anos. Tive a sorte de crescer numa casa onde havia uma grande biblioteca e desde criança li grandes autores e muitas biografias. Sempre me interessou a História e quando vim viver a Portugal, quis conhecer melhor o seu passado para poder perceber o porquê do seu presente. O meu marido, economista de formação, sempre gostou de arqueologia e nos seus tempos livres dedicava-se sobretudo ao paleolítico e muito mais tarde ao período romano. A investigação de uma época mais recente deu-se há relativamente poucos anos. Eu já tinha publicado O Afinador de Pianos, O Lázaro do Porto e O Segredo da Bastarda, quando ele publicou o seu 1º livro sobre o General Norton de Matos, como vê andávamos a investigar coisas muito diferentes. Conversamos sobre os temas das nossas pesquisas mas temos vidas literárias separadas e temo que uma tentativa de influência de alguma das partes possa acabar em divórcio.:)

HT: O trabalho de investigação é bem notório nos seus livros. O que é que lhe leva mais tempo, a investigação ou a escrita?
Cristina Norton:
O trabalho de investigação é sempre mais lento, ainda que eu precise de pelo menos 2 anos para escrever um livro.
 
HT: Os seus livros, na sua maioria, retratam acontecimentos da nossa história decorridos no final do século XVIII e início do XIX. Este é o seu período da história preferido?
Cristina Norton:
É o período da Historia portuguesa que considero mais rico, menos estudado (lembro-lhe que escrevi os meus primeiros romances históricos há mais de 12 anos) pelo menos na altura. E estou convencida que as divergências e atitudes entre absolutistas e liberais ainda estão presentes nos nossos dias, o que torna essa época ainda mais interessante.

HT: No “Guardião de Livros” descreve-nos a viagem dos Livros da Real Biblioteca, assim como a vida do bibliotecário que os acompanhou, Luís Marrocos. Uma vez que ele não é uma personagem histórica com grande mediatismo, como é que o “conheceu” e surgiu o interesse de escrever sobre ele?
Cristina Norton:
Foi graças ao discurso de agradecimento do grande escritor argentino, já falecido, Tomás Eloy Martinez, ao receber em 2006 o primeiro Prémio da Casa da América Latina de Lisboa, pelo seu livro O Voo da Rainha. Nele falou com aquele entusiasmo contagiante que o caracterizava da viagem de uma biblioteca portuguesa que atravessou o Atlântico até chegar ao Rio de Janeiro na altura das Invasões Francesas. Perguntei-lhe onde tinha lido essa história que eu desconhecia e ele disse-me que num livro escrito por uma historiadora brasileira, Lilia Moritz Schwarcz, A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis. A partir dessa história comecei a investigar e tive conhecimento das 186 cartas que Marrocos escreveu aos pais e a irmã, e que o seu pai, sendo arquivista da Real Biblioteca do Palácio da Ajuda, teve a feliz ideia de as doar ao arquivo. Foi um dos elementos importantes para a investigação, porque apaixonei-me pela figura do Marrocos, à medida que lhe ia descobrindo manias, defeitos, pecados e virtudes.

HT: O livro “O Segredo da Bastarda” conta-nos a história de Eugénia de Meneses, da sua vida na corte e da filha que nasce de um amor proibido. Este é um livro que nos consegue prender e quase nos transporta para aquela época. Li algures que deixou aqui uma “porta aberta” para continuar a história da filha num outro livro. Isso irá concretizar-se?
Cristina Norton:
Por enquanto estou a investigar uma década do século XX para um próximo romance. A vida da bastarda é rica em experiências e também ela guarda um segredo que nunca foi revelado. Voltar a mergulhar numa investigação que pode levar anos e não obter os resultados necessários para um livro não é algo que me seduza neste momento.

HT: Quais as suas referências em termos literários?
Cristina Norton:
Desde que aprendi a ler, devorei tudo o que encontrava. Desde enciclopédias, clássicos, romances de capa e espada, história, literatura latino-americana, francesa, inglesa, espanhola, japonesa, americana, hindu, russa, italiana e muito mais. A literatura que descobri de adulta foi a portuguesa, por ser a menos divulgada nos países em que vivi antes. Provavelmente esse seja o motivo de não poder referir um ou outro autor, mas posso dizer que a boa literatura sempre fez e continua a fazer parte da minha vida.

HT: Para finalizar, uma pergunta que já é habitual nas nossas entrevistas: para quando o próximo livro?
Cristina Norton:
Está delineado na minha cabeça, tenho muitos apontamentos, mas ainda não o comecei a escrever. Sou uma escritora lenta, escrevo e reescrevo os livros até sentir que podem ser publicados. Por enquanto não posso dar-lhe uma data. 

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